Por Alícia Madrid
Os processos de
transformação cultural dentro da formação identitária do Brasil, segundo Darcy
Ribeiro: desde o início, somos impositores da lei que nos oprime.
A cultura está em constante mudança, basta olharmos para o passado,
mesmo que por um breve momento, para encontrarmos diferenças culturais entre as
gerações mais antigas e as que viveram posteriormente. Bauman (2012) acredita
que a cultura pode ser herdada ou incorporada, como um produto a ser consumido
por cada ser humano que nasce, e sendo uma propriedade, é passível de ser
“adquirida, dissipada, manipulada, transformada, moldada e adaptada.”
Laraia (2009) afirma
que a cultura é dinamica na medida que os homens “têm a capacidade de
questionar seus próprios hábitos e modificá-los” (p.95). O autor discorre sobre
dois processos de mudança cultural: o primeiro diz respeito à mudança que
ocorre intrinsecamente em um sistema, resultado da reavaliação das interações
sociais e produto das forças de protesto e das lutas de um determinado grupo social.
O segundo processo
ocorre através do choque entre culturas diferentes, situação na qual pode haver
uma aculturação civilizatória brutal e impositiva ou branda e sutil. Seja qual
for a natureza da influencia de uma cultura sobre a outra, o autor defende que
esse processo de transfiguração cultural existe em praticamente qualquer
cultura: o encontro entre sociedades difirentes sempre resultará em algum tipo
de intercâmbio cultural.
Durante toda a
história da humanidade observamos como o confrontamento entre culturas resulta
em uma luta de poder pela conquista não só de capital e recursos, mas também da
supremacia ideológica, o que se configura em vários aspectos sociais e áreas do
conhecimento. Poucas foram as culturas que, havendo dominado outra militarmente,
respeitaram-na e permitiram que os derrotados mantivessem suas crenças,
costumes e valores, enfim, sua cultura.
O Brasil não foi uma
exceção, porém, aqui, diferentemente da maior parte dos outros lugares do
mundo, houve uma intensa mistura entre culturas advindas de continentes
diversos. Tal mistura gerou as sementes que, nesta terra, dariam início ao povo
brasileiro. Desde então, nossa população se tornou cada mais um produto hibrido
que carrega não só os genes de índios, africanos e europeus, mas também a
bagagem histórica de supremacia e sofrimento vivida por eles ao chocarem-se em
si. Nas palavras de Darcy Ribeiro (2006):
“Todos nós, brasileiros, somos carne da carne dos pretos indios
supliciados. Todos nós brasileiros somos, a mão possessa que os supliciou. A
doçura mais terna e crueldade mais atroz aqui se conjugaram para fazer de nós a
gente sentida e sofrida que somos e a gente insensível e brutal, que também
somos.” (p.108)
No momento em que a
cultura brasileira passou a se consolidar e os integrantes das três matrizes
culturais que a compunham começaram a efetivamente se ver como brasileiros, um
novo processo foi criado: o processo de mudança interna do recém-construído
povo brasileiro. Foi quando os primeiros brasileiros, diferentes em suas
raízes, mas majoritariamente uniformes em sua condição como oprimidos, “se
configura como um povo em si, que luta desde então para tomar consciencia de si
mesmo e realizar suas potencialidades” (RIBEIRO).
Nos séculos
seguintes, o povo nascente construiu e incorporou as características que hoje o
definem, agregou um pouco de cada matriz que o originou e, por isso, se tornou
único.
A duplicidade moral
defendida por Darcy Ribeiro tornou-se parte do que é a cultura brasileira,
carregada de estereótipos que buscam uniformizar uma gente tão complexa que dá
a impressão de unir vários mundos em um só país.
Com ideais de
igualdade e união, esperamos que o processo de endo-transformação cultural
aflore cada vez mais o lado humano e resiliente que nos faz ter orgulho da
terra onde nascemos.
Referências:
BAUMAN, Zygmunt.
Ensaio sobre o conceito de cultura. LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um
conceito antropológico. RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o
sentido do Brasil.
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