(Kandinski)
A técnica, a capacidade de harmonizar e despertar nossos sentidos, só se realiza quando educa e constrói ao mesmo tempo esses sentidos, despertando a inteligência e o prazer que o belo nos traz. Não existe um belo absoluto, embora certas obras de arte sejam quase unanimemente consideradas belas. No entanto, só é belo aquilo que consideramos belo. O homem constrói para si e para os outros. A contemplação do belo é algo profundamente individual, como a construção da própria arte é um ato de total e profundo egoísmo. Ao compartilhar esse egoísmo, o artista não busca a consagração de sua obra, mas o reconhecimento de outros sentidos àquilo que ele sentiu. Portanto, não uma beleza, apenas: várias, dentre as quais a do próprio criador. A apreciação da obra de arte torna-se, assim, um ato de integração dos sentidos do observador com os sentidos do criador. O penico do Duchamps só é obra de arte para quem a considere uma obra de arte. Assim também a Vênus de Milo ou a Gioconda. O que há por trás da arte é apenas a arte, nada mais que a arte, ou seja, a técnica. Qualquer tentativa de buscar sentidos ocultos, profecias, mistérios e outras bobagens metafísicas cai no ridículo de tentar aceitar o inaceitável, de acreditar em duendes ou espíritos, de buscar o imponderável onde há apenas a técnica humana e a sua arte mais impressionante, a sua capacidade de criar. Não nos espantemos, portanto, com a morte do belo. Temos coisas mais importantes com que nos preocupar do que o reverenciarmos. Temos um mundo imperfeito e uma arte imperfeita a atrair nossos sentidos e, através deles, torná-los, ao mundo e à arte, imagens que nos agradam ou desagradam, sem qualquer juízo outro de valor que não esse filtro impressionante que se chama sensação, ou simplesmente, prazer. A arte só é arte quando nos causa prazer, deleite, sem que esses termos não deixem de conter em si algo de dor, de sofrimento, de angústia, pela compreensão do mundo que eles nos trazem ao contemplar aquilo que nos agrada. No fundo é isto: a arte só se realiza como arte quando nos revela um pouco mais de nós mesmos e do mundo em que vivemos. Sem metafísicas. Sem juízo de valor. Porque, afinal, a arte só é arte quando a arte não é arte. Quando nós a transformamos em arte. E em beleza, que só existe porque nós existimos e porque nossos sentidos a registram.
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