sábado, 2 de junho de 2012

Qorpo Santo: um dramaturgo que refletia um teatro crítico brasileiro, por excelência.

Qorpo Santo

Qorpo Santo

Por Fábio Fernandes

O que se conhece sobre a dramaturgia de José Joaquim Leão que tem por nome artístico: Qorpo Santo, é a configuração na imagem de um escritor que beirava a loucura, o subjetivismo e sinais de insanidade. Qorpo Santo era natural de vila do Triunfo, interior do Rio Grande do Sul, vivia em meio ao contexto da revolução farroupilha, após a morte de seu pai, parte para Porto Alegre para estudar gramática, isto contribui expressivamente nas suas ações voltadas a arte dramática.

Ao fundar um grupo dramático em 1851, Qorpo Santo posteriormente inicia seus escritos para jornais provinciais. Ao deixar o magistério ao qual trabalhara desde que chegou em Porto Alegre passa a lecionar diversos cargos na direção do colégio São João em 1856, ao mudar-se para a cidade de Alegrete. Qorpo Santo funda um colégio no qual tem seu nome na fachada da estabelecimento educacional, assim o escritor vem com o tempo adquirindo respeitabilidade como figura pública, escrevendo para jornais locais e ocupando ainda cargos públicos de delegado de polícia e vereador.

Por volta de 1864, o dramaturgo começa a sofrer de alucinações, o que o leva a ser internado e examinado por médicos no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro. É em meio a esse período conturbado a consolidação da maior parte de seus trabalhos. As peças que compõem o teatro de Qorpo-Santo têm uma longa história. Escritas na estranha grafia proposta pelo autor, todas decorrentes de um período de intensa criatividade, este período latente é de 31 de janeiro e 16 de maio de 1866.

Mas o que faz d Qorpo Santo um grande nome na história do teatro brasileiro, é a força de suas obra, não apenas na construção de textos tearais por excelência, nos quais podem se destacar: Ensiqlopèdia ou seis meses de uma enfermidade(obra em nove volumes, dos quais, até o momento, são conhecidos seis, que reúnem poemas, confissões, receitas culinárias, máximas e suas dezessete peças teatrais. A grafia ensiqlopédia surge de uma reforma ortográfica proposta pelo autor e defendida em artigo no jornal A Justiça em 23 de outubro de 1868. ), Certa identidade em busca de outra, Eu sou a vida eu não sou a morte, Um credor da Fazenda Nacional, As relações naturais, Hoje sou um; e amanhã sou outro, Um assovio, Um parto,Hóspede atrevido ou O brilhante escondido, A impossibilidade da santificação ou A santificação transformada, Dois irmãos, A separação de dois esposos, La, Lanterna de fogo, Marinheiro escritor, Marido extremoso,Elias e sua loucura bíblica; com destaque para a comédia Mateus e Mateusa.

No universo delirante destes textos teatrais, Qorpo-Santo mostrou homens e mulheres presas de contradições terríveis. Elaborou tramas que envolviam adultério, homossexualidade, violência, inconformismo. E isso num momento em que o grande sucesso do teatro em todo o mundo era A dama das camélias, de Alexandre Dumas Filho, com sua dramaturgia bem- comportada e a esmagadora vitória da moral burguesa ao final.ou seja, percebe-se que Qorpo Santo tinha um teatro que ia de encontro ao ideal burguês-elitista da época, ou seja um teatro político e de cunho popular.

Na provinciana Porto Alegre, Qorpo-Santo inventava um teatro feito de irreverência, arbitrariedade, absoluto desprezo pelas convenções. Fatores destacados, por exemplo, em Hoje sou um, amanhã outro, As relações naturais e Um credor da Fazenda Nacional. Muitas de suas peças eram animadas por furiosa oratória que fustigava as convenções e investia contra o grupo social que Dumas consagrava e a cujos preceitos se curvava.

Em suas peças o autor citava um pouco do seu eu, eis um trecho de Hoje sou um, amanhã Outro:

“ MINISTRO - É filho de um professor de primeiras letras; seguiu por algum tempo o comércio; estudou depois, e seguiu por alguns anos a profissão de seu Pai, roubado-lhe pela morte, quando contava apenas de 9 a 10 anos de idade. Durante o tempo do seu magistério, empregou-se sempre no estudo da História Universal; da Geografia; da Filosofia, da Retórica - e de todas as outras ciências e artes que o podiam ilustrar. Estudou também um pouco de Francês, e do Inglês; não tendo podido estudar também - Latim, conquanto a isso desse começo, por causa de uma enfermidade que em seus princípios o assaltou. Lia constantemente as melhores produções dos Poetas mais célebres de todos os tempos; dos Oradores mais profundos; dos Filósofos mais sábios e dos Retóricos mais brilhantes ou distintos pela escolha de suas belezas, de suas figuras oratórias! Foi esta a sua vida até a idade de trinta anos.”

O professor Eudinyr Fraga (grande pesquisador da obra de QS) defende a tese de que, ao contrário do que se afirmou durante décadas, que o teatro de Campos Leão não tem a ver com o teatro do absurdo de Eugène Ionesco e Samuel Beckett,mas sim com o surrealismo de Breton, Duchamp, René Magritte entre outros. Um dos argumentos é a presença das divagações dos chamados ''fluxos de consciência'', método que aparece no surrealismo do início do século 20 como ''automatismo psíquico puro''. A enxurrada de palavras aparece em diferentes textos, entre os quais As Relações Naturais. Mas também há elementos do absurdo.

O professor Ednyr salienta que “Se o autor parece ansiar por um mundo em que prevaleçam a ordem e a obediência aos preceitos religiosos e legais, logo se insinua a malícia e o deboche, colocando em ridículo tais objetivos e mostrando a precariedade de nossos juízos".

Levaram quase um século para deixar o papel e tomar forma no palco. Consideradas por seus contemporâneos obras de um insano, caíram no esquecimento, do mesmo modo que toda a produção de Qorpo-Santo, até serem resgatadas desse buraco negro em meados do século 20, devido ao esforço de intelectuais e artistas gaúchos.



Referencias

http://pt.wikipedia.org/wiki/Qorpo_Santo

http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_teatro/index.cfm?fuseaction=personalidades_biografia&cd_verbete=8960

< http://www.iluminuras.com.br/v1/verdetalheslivros.asp?cod=341



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