domingo, 30 de agosto de 2009

Aurora Numbora (Ato 1- Cena 1)

SEBIM - (Pra platéia) Meu povo querido, sem nenhuma falsidade quero mostrar o quanto é que esse “lugarzim” é “pôde” . O povinho que mora aqui não tem nada pra fazer e vive por ai falando mal de uns e “dozôto” mas esse povinho ta pra deixar disso,pois eu vou me tornar o maior barão que esse lugarzinho já viu...querem apostar?

LUCILIO - ( Já vem xingando o Sebim ) Mas o que é que esse mendiguinho de rua analfabeto quer por aí ,falando sozinho?E ainda mais, dizendo que vai ser um barão! É muita falta de “pêia” mesmo! (risos) é... parece que a melhor coisa que fiz em toda minha vida : foi ter saído desse fim de mundo.

SEBIM - (Desconsolado) É ! Quando alguém fala uma coisa dessas , é sinal que a “besteralidade” já afetou o seu juízo! Isso é, se ainda tiver. Mas meu paizim disse uma coisa que nunca vou “isquecê” que é “nunca fale merda, senão a catinga é pior que peido inturído” ... (olha para o lado e percebe Artênio aproximar-se,e fala pra platéia) Eita “jabo” lá vem o Artênio...Ele é um desses “cabôcos” que pra variar num têm um centavo furado no bolso ,mas é um rapaz corajoso e sonhador ,ta doidinho pela gostosa.. é ... q - quero dizer mocinha prendada ... filha de “seu Leopoldo”(sorri ironicamente) Lá vem o pobre...

ARTÊNIO - ( Lamentando-se,mas bem otimista,traz uma rosa na mão) É ... espero que hoje seja um dia lindo,pois vou presentear minha querida Martinha com a rosa mais bela que encontrei no jardim,ela merece a prova do meu amor. Ah como é bom amar!

SEBIM - (Narrando) É uma pena mas o pobre moço não sabe o triste destino que o aguarda... só quero ver onde isso vai parar! (pra platéia) e você também quer saber o que vai acontecer?Então não desgrude um “momentim” se quer... (pausa) êita que esse “pinico” vai ter bosta!

LEOPOLDO - Ei menino o que é que tu faz aqui nessas “hora”, num devia tá no roçado pastorando as ”uvêia”?

ARTÊNIO - É que estou só tirando uma “hórinha” de folga.

LEOPOLDO - E essa rosinha na mão, virou jardineiro ou ta querendo ser fresco “mermo”? rapaz tanto que tua mãe me pedia pra te dar conselho ...e tu já ta virando a casaca? abre o ”zói” menino,Deus tá vendo!

ARTÊNIO - Né nada disso não, é que eu queria vê a sua maravilhosa filha, num sabe?!.

LEOPOLDO - (Interrompendo) É O quê?! Mau tirou as “cueca mijáda” e já quer se “aproxegá” pra “riba” de minha fia! Ó o respeito seu cabra! ela é uma moça, e num é pro seu bico.

ARTÊNIO -- Oxe! e o que é que tem demais em dar uma rosa pra sua filha? não é pro meu bico, mas sei ser uma pessoa decente,fina e educada.

LEOPOLDO --Decente o quê? Minha menina é requintada igual a finada sua mãe (com os braços pro céu,se benze) que Deus a tenha! não vai “assucedê” de dá o "adisfruti" pra um roceiro como tu.

ARTÊNIO --Mas se sua filha puxou o requinte de sua finada e queridíssima esposa ; ela vai dar sim.

LEOPOLDO – Mas “pruquê”?

ARTÊNIO – Ué, sua mulher num deu pro senhor?(risos).

LEOPOLDO -- (irritado) Como é que é seu cabra? você ta se comparando “cumigo” é? nunca fui de dá rosinha pra “muié”...isso é coisa de cabra “frôxo” que se mija quando vê um cabra macho.

ARTÊNIO – Desculpe-me seu Leopoldo,eu só queria ser um homem feliz.E ter uma esposa como Martinha, seria um sonho...


LEOPOLDO -- Minha fia vai é se ajuntar com um "homi" que tenha "cundição" de manter a bichinha
bem "sardavi" ,limpinha e ”honrróza”, num criei “fia” pra acabar “muié” de um (pausa) roceiro.

ARTENIO – (Dengoso) Não fale assim comigo desse jeito o senhor me machuca.

LEOPOLDO – Oi, quer um conselho? "rebóle" essa “frô” e vá pastorar as "uvêia" que é o “mió” que tu faz.

ARTENIO –M -mas...


LEOPOLDO - Cala a boca e vá trabalhar (pausa, Artênio sai) donde já se viu um roceiro liso, quase pedindo esmola "querê” uma moça,e que moça! a minha “fiazinha” linda!(pra platéia) que vai se formar em “dotôra” um dia e vai sê rica e inté morá na cidade...é, parece que tem gente que num pensa,esse menino é um daqueles três"L":liso,lascado e lezado,”púcerto” acha que sou um três “B” bebo -burro,besta,bundão e béstaiado ele devia saber que sô um “homi” três "C":safado, sabido e superior
(orgulhoso,pra platéia) Eita que “homi” bruto!

(sai de cena)

(Quando Leopoldo sai, entra Sebim, com a cara de admirado, vendo que o velho não gostou nada do sentimento afetivo do Artênio por sua filha)

SEBIM – Então quer dizer quer dizer que o velho num gostou de saber que o matuto do Artênio gosta da “fia” d’ele!(desconfiado) êita que tô “doidim” pra ver uma cachorrada por essas bandas, ta que eu tive uma idéia !(risos)

(na mesma hora ,o Lucílio vem caminhando no meio da rua , percebe que Sebim se aproxima)

LUCILIO – Mas o que é que um desocupado quer aqui perto de mim ,um homem formado, digno do respeito e da cordialidade nos finos tratos de uma sociedade altamente nivelada e de porte tão superior?

SEBIM – (concluindo) E que está no meio de um “interiorzinho” que fica bem localizado onde Judas perdeu as botas, que possui o sublime nome de (soletrando) Bo-do-ro-có.

LUCILIO - Cale-se seu analfabeto. Será que não sabes que estou à paisana levemente curtindo minhas férias?Que por sinal; “merecedíssimas”.

SEBIM – É,pra quem se diz requintado de alta classe...num fim de mundo desses, é meio esquisito mesmo!

LUCILIO – É sim,e veio bem a calhar com a frase famosíssima do filósofo grego Pero Vaz de Albuquerque, “ O capitalismo é meu pastor, por isso estou pastando”.

SEBIM – É uma frase bem idiota mesmo!

LUCILIO– (com as mãos para o céu) Ah pai, perdoa porque não sabe o que diz!(olhando no olho de Sebim) é muito intelectual pra sua mente limitada. Mas me conte qual o motivo, razão, circunstância , motivo de base preponderante de sua inútil procura a mim? Se for dinheiro emprestado, pode cair fora.

SEBIM – Não é nada disso, andei sabendo que o povo tá comentando que você não é de nada e além de passar de um babaca , é letrado... mas nunca conseguiu conquistar uma moça de família.

LUCILIO - (irritado) Mas que povinho abusado!

SEBIM – (concordando) É sim, (irônico) e como sou inferior a você...

LUCILIO – (concluindo) E bota inferior nisso!

SEBIM - Acho que o povo ta é com inveja de tu e dúvida da sua capacidade pra conquistar uma mulher.

LUCILIO – (Em tom de superioridade) Eu consigo tudo que quero.

SEBIM – Mas o coração da Martinha não.

LUCILIO – E quem é essa tal de Martinha?

SEBIM – Oxi! E não lembra? É a filha do fazendeiro Leopoldo, a moça mais desejada do “arraia” de Bodorocó, seu pai só quer pra filha d’ele,um homem formado , você deve de ser um grande “adévogado”, respeitado e estudado...tô certo ao seu respeito?

LUCILIO – Claro que sim. Mas não me importo com o que essa gentinha pensa de mim, e não estou nenhum pouco afim de filha de ninguém.

SEBIM – Eita que o povo ta certo. Tu num tem é capacidade pra isso. Desse modo, quero morrer burro!

LUCILIO – (se orgulhando) Jamais subestime a capacidade de um homem culto como eu.

SEBIM – É... parece que você vai perder mesmo pro “jéca” do Artênio .O cabra mais lascado e burro de toda Bodorocó.(pra platéia) que coisa não!

LUCILIO– Ta legal você venceu. (determinado) irei conquistar o coração dessa tal de Martinha. Afinal, é minha “reputation” que está em jogo, não permitirei zombarias por um bando de matutos ignorantes.

SEBIM– Eita que cabra macho!

(Saem de cena , de repente Lucilio vai falar com sua mãe)

Nenhum comentário: