Baseado no conto Sarapalha, de Guimarães Rosa, com adaptação, cenário e direção de Luiz Carlos Vasconcelos, o espetáculo conta com os atores do Grupo Piollin, que se dedica ao trabalho pedagógico e social com crianças de João Pessoa, Paraíba.
Foto: extraída da internet
A ação se concentra entre dois primos que, vítimas de malária, esperam a morte sentados lado a lado. No trabalho físico cuidadosamente elaborado, cada parte do corpo dos atores cumpre um papel expressivo, tanto na postura global da personagem quanto em movimentos sutis ligados à ação, de forma a compor uma coreografia de gestos da qual participam os pés, o pescoço, a máscara facial. Um simples ficar de pé tem o peso da entrada do naipe de metais em uma sinfonia e é realizado em um tempo próprio ao contexto dramático, ao subtexto da personagem e à musicalidade da cena. Todo o espetáculo está construído sobre uma partitura musical, da qual fazem parte não só as palavras mas também os grunhidos e os sons do ambiente em que se encontram as personagens e que são executados pelos próprios atores.
Além das duas personagens que se encarregam da parte verbal do espetáculo, há a mística Negra Ceição que murmura sons e ladainhas incompreensíveis, rondando a conversa dos dois homens. A mulher procura evitar que a conversa tome um rumo trágico: um dos primos nutre uma paixão secreta pela mulher do outro, que fugiu de casa com outro homem. Esta revelação será feita ao final, quando o marido abandonado começa a agonizar. A cena é precedida de um ritual em que Negra Ceição, levando na mão uma cabaça de água, circunda os dois homens com a urgência de quem deve realizar um salvamento. Ao contrário dos homens, que permanecem sentados, a atriz trabalha sempre em deslocamento e, como personagem que comenta a ação central, sua composição tem humor, sem que ele seja sua finalidade. Ao lado dos dois homens está o Perdigueiro Jiló, cuja interpretação dá lugar, segundo a crítica Barbara Heliodora, a "um dos mais extraordinários exemplos de criação corporal que temos visto em nossos palcos".1 É o cão que inicia o espetáculo, deitado no palco, dormindo um sono atormentado que se agrava pela angustiante coceira. Separado dos atores, mas dentro da cena, está o Capeta, que sonoriza o espetáculo com objetos, além de fazer o fogo e emergir dele.
Se a história não chega a todos os espectadores pelas sobrecargas visuais e sonoras que se sobrepõem ao texto, chegam as imagens que, segundo a crítica de O Globo, recriam a literatura: "... por um ato de amor, de carinho com cada mínimo detalhe da obra do escritor, Vasconcelos conseguiu essa coisa rara que é a recriação, em outro veículo, de uma obra bem-sucedida no original (...)".
Em 1993, o espetáculo recebe o Prêmio Shell na categoria especial. O espetáculo é apresentado em todo o Brasil e, mesmo sem fazer longas e contínuas temporadas, permanece em apresentação por dez anos.
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